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Catedral Metropolitana e Secretária de Turismo e Cultura Paróquia Bom Jesus Crucificado e Folia de Reis

No dia 31 de agosto, o Sr. Rafael Huhn, secretário de Turismo e Cultura de Pouso Alegre, comentou sobre a realização de um Encontro de “Folia de Reis” em frente à catedral, no dia 24 de setembro, e sobre a possibilidade de celebrar uma missa com a participação dos grupos. Achei muito interessante e sem questionar respondi: “perfeitamente”.

            Desde criança recordo que, alguns dias depois do Natal, ficávamos na expectativa de ver passar pela rua de nossa casa “aqueles homens esquisitos” que visitavam as casas tocando músicas alegres em louvor aos “Santos Reis” e ao nascimento de Jesus.

            “Aqueles homens esquisitos” vinham sob a liderança de uma pessoa com uma bandeira com a estampa dos Santos Reis cumprindo rituais tradicionais de uma imensa riqueza e beleza. Acompanhavam este líder várias pessoas tocando instrumentos, em sua maioria de confecção caseira e artesanal, com tambores, reco-reco, flauta, uma espécie de violino rústico, sanfona, gaita, além da tradicional viola caipira, etc. Dançarinos, palhaços e outras figuras folclóricas compunham aquele grupo e muitos causavam medo.

            Ao som das músicas, e antes de surgirem estes “homens esquisitos” na rua onde morava minha saudosa mãe, ela explicava: “Estes homens esquisitos passam de casa em casa, revivendo a caminhada dos magos que partiram do Oriente rumo à cidade de Belém em busca do Menino-Deus. Eles repetem a tradicional visitação feita pelos três Reis Magos, denominados Belchior, Baltazar e Gaspar os quais passaram a ser reverenciados como santos a partir do século VIII”. Era um dia de festa pela rua. Depois as pessoas iam acompanhando o grupo pelo bairro.

            A cada ano, eles iam modificando e ganhando características diferentes ao vivenciar a passagem bíblica que relata a visita dos três Reis Magos ao Filho de Deus.

            Desde aquela época, percebemos que as companhias de “Folia de Reis” têm uma unidade ritual autônoma. Não estão submetidas à orientação da Igreja institucional, e ocorre fora das igrejas e sem a presença do clero. Mesmo assim, são celebrações totalmente bíblicas, um exemplo vivo de fé e devoção manifestando uma realidade simbólica e imaginária do mistério da Epifania do Senhor.

            O mundo contemporâneo criou um espaço urbano desagregador que inviabiliza o fortalecimento dessa tradição cultural. Cabe à comunidade preservar aquilo que lhe é próprio, que ela reconhece como um bem que possui identidade.

            Assim, juntamente com a Secretaria de Turismo e Cultura, a Catedral Metropolitana, na dimensão da Pastoral Urbana, quer ajudar na preservação dos Grupos de Reis, fazer memória, reavivar as crenças e valores, reviver as saudades e levar os fiéis a reconstruir o grande vazio existencial da contemporaneidade, resgatando a Folia de Reis.

            Pouso Alegre, assim como em outras cidades em crescimento, 80% das pessoas vivem nas cidades, ao contrário de décadas anteriores, quando a maior parte vivia nas áreas rurais, exercendo atividades de subsistência.

            Na vida rural, a referência fundamental para o homem estava fundada em três instituições: a Igreja, o trabalho e a família. Os parâmetros para as relações sociais eram ditados pelo pároco, pelo patrão, pelo cônjuge ou pelos pais. O cotidiano estava intimamente ligado aos “espaços-símbolos” dessas instituições: a matriz (ou capela), o campo e a casa.

A década de 1960 marca o início da reversão desse modelo social. As pessoas percebem, no processo de crescimento industrial e no rompimento com os valores tradicionais, o surgimento de uma sociedade não estagnada, onde há possibilidade de ascensão nas condições de vida e de trabalho. A cidade apresenta-se como espaço adequado para essa relação.

            O ambiente urbano, com o qual o homem do campo se depara, é como que uma “teia de aranha”. A cidade prospera organicamente, empurrando todos os limites possíveis. Nada de fronteiras, nada de interdições, nada de limites. As instituições Igreja, trabalho e casa, se tornam completamente difusas no novo cenário.

A forma de pensar do homem que vive a mentalidade do urbano, de certa forma, tomou a Igreja de surpresa. Vários exemplos poderiam ser dados para ilustrar a inaptidão eclesial diante da urbanização e rurbanização

É imprescindível saber analisar o contexto, para entender como ele influencia o modus vivendi do cidadão urbano, para assim perceber até que ponto nossas iniciativas representam um incentivo para a participação consciente na vida de Igreja e não um fardo, em contraponto com a realidade.

 A Catedral, promovendo e incentivando a Festa dos Grupos de Reis, quer  focar sobre a dimensão e o valor da vivência do domingo na vida dos fíeis como dia de solidariedade, partilha, encontro, festa e principalmente da celebração e participação da Eucaristia e quer também valorizar esta expressão da religiosidade popular,  a Folia de Reis.

 

 

Côn. Edson Oriolo

Cura da Catedral de Pouso Alegre

 

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