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Morangueiros se unem em torno de projeto do Sebrae em Bom Repouso

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Texto Camila Pastorelli*
Fotos Henrique Pimentel
Seu Mário começa a cuidar de seus canteiros logo cedo. Por volta das seis e meia da manhã, ele já está na plantação, abrindo a cobertura de plástico branco que protege as frutas do frio da Serra da Mantiqueira. São 16 mil pés de morango, cultivados com todo o carinho. ´Eu acho gostoso trabalhar aqui, chego cedo e só vou embora de noite. Fico limpando, ajeitando… Tem dia em que nem almoço´. Mário da Costa, de 41 anos, vive com a família no Bairro dos Garcias, no município de Bom Repouso, um dos maiores produtores de morango de Minas Gerais, ao lado de Pouso Alegre e Estiva. Em 2008, a região colheu 14,8 mil toneladas, de acordo com a Emater – Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural. O morango é um dos pilares de sustentação da economia local e vem ganhando projeção no estado, principal produtor da fruta no país, com 76,4 mil toneladas no ano passado, segundo levantamento da Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Em 2007, a Associação de Moradores do Bairro dos Garcias procurou o Sebrae-MG – Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais para organizar e capacitar os produtores, até então abandonados à própria sorte ou dependentes de atravessadores. ´Os moradores já tinham uma visão de associativismo, compravam cesta básica juntos. Começamos a trabalhar a partir daí, observando quais eram as dificuldades deles´, aponta o analista do Sebrae Rodrigo Pereira.Rapidamente, o grupo constituiu a Associação dos Pequenos Produtores de Morango dos Garcias e, não muito tempo depois, graças ao apoio do Sebrae, ergueu a Central de Negócios Coração do Vale, com câmaras refrigeradas, fundamentais para a comercialização direta, sem a interferência dos atravessadores, que até então determinavam o preço que receberiam pela fruta. Como o morango é perecível – dura até 2 dias sem refrigeração -, não havia muita opção para os moradores do Garcias, que entregavam o produto por preço abaixo da média do mercado. ´O atravessador vinha à roça para comprar e, como a gente não sabia quanto valiam, vendíamos por quanto eles queriam´, diz o presidente da associação, Jesus Batista de Godoi.

Com a formação da Central de Negócios, os morangueiros de Bom Repouso passaram a administrar melhor o próprio comércio. Além das vendas em conjunto, as compras de insumo seguem a mesma linha, o que resulta em uma economia de 27% nos gastos com mudas, lonas, adubos e outros produtos. Já foi possível comprar uma pequena camionete para facilitar o transporte das caixas, além da câmara fria para estocar os morangos que não são vendidos, evitando perdas.

Atualmente, a central conta com 22 produtores com 205.164 mil pés plantados – cerca de 3 hectares. Com essa área, conseguem entregar até 4.500 mil caixas de morango por semana. A maior parte da produção vai para a Ceagesp – Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, e o restante segue para sacolões e mercados de Bom Repouso e de cidades próximas, como Pouso Alegre. Cada produtor recebe de acordo com a quantidade de caixas que entrega. Em 2007, a renda da maioria estava entre 380 e 450 reais; em 2008, os morangueiros de Bom Repouso chegaram a receber de 450 a 800 reais.
Seu Mário não tem muito do que reclamar, afinal, consegue lucrar por volta de mil reais por mês só com a produção da fruta – cerca de 480 caixas por mês. Diz que dá para pagar as novas despesas da casa, que agora incluem grande quantidade de fraldas dos novos integrantes da família, os gêmeos Miguel e Laura, de apenas um ano. A colheita é feita três vezes por semana, e, graças ao friozinho da montanha e à compra de mudas melhores, é possível colher durante o ano todo. A diferença é que agora o morango vale mais. O preço médio em 2007 era de 2 reais por caixa, que pesa 1,2 quilo. Já em 2008, o preço saltou para 4,50 reais. Segundo ele, não tem mais essa história do atravessador dar a palavra final na hora da compra. Os associados olham diariamente a cotação da fruta na internet, pelo computador da Central, e já sabem por quanto vão vender. Outros produtores da cidade, que antes diziam que se organizar era perda de tempo, agora telefonam para saber quanto está valendo o morango, para não serem passados para trás. ´O maior cuidado que tem de ter é com o solo´, afirma João Batista dos Santos, de 42 anos, que sabe da importância de preparar bem a terra para a plantação de um fruto tão delicado como o morango. A adubação é verde e para isso são cultivados aveia, milho e crotalária – grande fixadora de nitrogênio no solo.
Muitos morangueiros usam somente a quantidade máxima permitida de agrotóxico, e outros a sabedoria popular – cravo-de-defunto, alho e cebola para espantar as pragas pelo cheiro. Seu João sabe muito bem: ´Os produtos que são tóxicos têm a caveirinha, para indicar que se abusar a gente pode ficar doente ou até falecer. Desses da caveirinha a gente não usa não, só os biológicos mesmo´. Para seu Mário também não tem esse papo de veneno para matar bicho. ´Não tem jeito de plantar com agrotóxico. Se eu for plantar o que meus filhos não podem comer, eu não planto´, diz.

A jovem Central de Negócios Coração do Vale está toda orgulhosa e cheia de energia. Receberam um terreno da prefeitura para ampliar a sede e já construíram um barracão, espaço que servirá para acomodar os compradores visitantes e embalar as caixas para a venda. Com sede nova e veículo próprio para transportar a carga, agora os produtores querem fortalecer a marca Coração do Vale, criada para o produto. A ideia é investir na personalização do morango – seja na forma de fruta, geleia ou licor -, para que ele obtenha a maior lucratividade possível, sem necessariamente dobrar ou triplicar a produção, como explica o analista do Sebrae. ´Não adianta dar um passo maior que a perna, tem de entender onde está e qual é o nicho de mercado. Ter um direcionamento estratégico para o que é realmente importante´, afirma.
Seu Mário quer mais é continuar com sua lavoura e, se possível, ampliá-la. ´A vida nossa é o campo. Nasci, vivi e vou morrer aqui´.

* A repórter viajou a Bom Repouso a convite do Sebrae de Minas Gerais. Revista Globo RuralFonte: TV Uai

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