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O desafio da leitura: uma pedra no caminho do futuro

O gigante adormecido que desperta, a economia que volta ao top 10 das mais poderosas do planeta, o país que vive seu mais consistente ciclo de prosperidade dos últimos 30 anos corre o risco de ver seu sonho de futuro brilhante embaçado pela miopia com que sempre tratou a educação.            Não sabíamos ler no passado, lemos pouco no presente e avançamos lentamente demais para um futuro que bate às nossas portas. Isso é o que se pode concluir de informações recentemente publicadas na imprensa sobre a lenta redução nas taxas de analfabetismo dos adultos e na preocupante persistência do iletramento das crianças e jovens que já estão na escola. Como bem alertou o sociólogo Simon Schartzman, se o tema fosse localizado entre os adultos e idosos, saberíamos que somos lenientes com uma dívida social do passado. Ao ver que o problema persiste entre crianças e adolescentes, temos de ser conscientes de que, como nação, ainda não tomamos plena consciência da gravidade desse drama que se perpetua.            A começar do fato de que, na sociedade contemporânea, intensivamente tecnológica e globalizada, o analfabetismo absoluto deveria ser visto como uma dessas doenças enterradas no passado, como a peste negra e a varíola. Ou seja, precisamos vê-las como inadmissíveis e absolutamente inaceitáveis, tanto quanto a fome.            Mas é necessário ir além. O analfabetismo absoluto é um conceito que tem pouca validade no mundo atual. Precisaríamos balizar nossas opiniões e nossas políticas pela noção contemporânea do problema, que é o analfabetismo funcional. No primeiro caso, são indivíduos que não sabem sequer os rudimentos do alfabeto. No segundo, são pessoas que sabem escrever e ler o próprio nome, mas permanecem incapazes de ler um jornal, um manual ou escrever um texto pouco mais elaborado.            E, nesse caso, as porcentagens sobem assustadoramente. Há um número para isso, calculado pelo Instituto Paulo Montenegro, ligado ao Ibope, que publica o Indicador Nacional de Analfabetismo Funcional (INAF). Os dados de 2009 mostram que apenas um terço dos jovens brasileiros de 15 a 24 anos se encaixa no que o indicador chama de “alfabetização plena”. Mais: 15% estão entre o analfabetismo total e a alfabetização rudimentar.            Esse dado só tem uma explicação, e ela é terrível: milhares de crianças e jovens estão passando pela escola e dela saindo ainda incapazes de ler (e, portanto, de escrever), em um nível inadequado para um país onde já faltam empregados qualificados. São crianças e jovens que não apenas terão dificuldades de inserção profissional, mas terão menos probabilidades de compreensão de seus direitos e deveres democráticos, sofrerão mais com doenças, marginalidade, gravidez precoce e exclusão.            É urgente mudar. E ainda é urgente sair desse estado de fatos em que todos concordam com a necessidade da mudança e tão pouco se faz para mudar.  (*) Francisca Romana Giacometti Paris é pedagoga, mestre em Educação e diretora de serviços educacionais do Agora Sistema de Ensino (www.souagora.com.br) e do Ético Sistema de Ensino (www.sejaetico.com.br), da Editora Saraiva

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