Vento que voa X Tartaruga Centenária
|Dias antes da festa do seu aniversário, a Avó foi até sua casa e entregou uma carta:
“Menina, tome aqui o enigma desse ano.”
Sua Avó, antes do aniversário de cada neto, sempre fazia isso: ia até à casa do aniversariante e entregava uma carta. Dentro, um enigma que tinha de ser desvendado até o dia da festa.
Quando o dia chegava, logo após os parabéns, lá vinha ela, trazendo a resposta do enigma no mais lindo dos embrulhos.
O dono da festa vinha correndo, com a resposta do mistério na ponta da língua.
Se desse a resposta certa, recebia sem rodeios seu prêmio, caso isso não acontecesse a
Vovó abraçava o Netinho, dava-lhe um beijo e dizia:
“Meu amor, apesar de estar crescido, você ainda não está pronto para saber o que está aqui dentro. Mas não fique triste, enquanto você se prepara, use esses sapatos, eles o ajudarão a trilhar o caminho da sabedoria.”
A Avó não entregar o presente que era a resposta do enigma até hoje só acontecera uma vez.
Foi com o Pedro.
Ele não soube desvendar o seguinte mistério:
“Meus olhos trazem para perto o que não está. Entre eles tenho algo parecido com um cotovelo e à sua frente uma objetiva. Quem sou?”
Na festa de aniversário ele ficou com os sapatos e enquanto vivia seus primeiros 365 dias com 8 anos, passou cada um deles na incerteza de se o que tinha naquela caixa linda em cima do guarda-roupa da sua Avó era ou não o que ele estava pensando.
Antes do aniversário de 9 anos ele recebeu a carta com o mesmo enigma e quando a Avó chegou à festa ele foi correndo e gritando:
“É um binóculo! É um binóculo!”
Então, àquela tarde quando a Menina viu a Avó chegar à sua casa com a carta na mão seu coração disparou.
Não saber responder aos enigmas da Avó era o mesmo que reprovar de ano na escola.
Aquela cartinha perfumada entregue com um sorriso e um beijo carinhoso funcionava quase como uma sentença de tortura.
A Menina pegou a sua e leu:
“Falo onde está aquele que, quando você não quer, voa como o vento, mas, se quiser que ande, se comporta como se uma tartaruga centenária fosse. Quem sou?”
Faltavam sete dias para o seu aniversário e daquele momento em diante a Menina começou a matutar: o que seria aquilo?
E ela dormia e acordava pensando.
Sonhava com o enigma.
Na escola, em casa, enquanto brincava, enquanto fazia suas obrigações, na natação, balé ou dentista.
Não havia um só momento em que não pensava: o que seria aquilo?
Os dias foram passando e não aparecia em sua mente nenhum sinal do que poderia ser a resposta.
Ela já estava começando a se desesperar: não queria ser a primeira menina da família a não conseguir responder ao enigma da Avó e só faltavam dois dias.
Foi na última noite, quando já estava triste e desiludida ficou sozinha no sofá da sala pensando o que poderia ser aquilo que corria quando ela queria que parasse e andava devagar quando ela queria que corresse.
“Acho que se eu tivesse mais tempo, descobriria do que a Avó está falando.”
Foi nessa hora que seus olhos brilharam:
“Claro! Como não pensei nisso antes? Só tem uma coisa que me mostra onde está o que voa quando eu quero que pare e anda como se uma tartaruga centenária fosse quando eu quero que corra! Só uma coisa é capaz de me mostrar isso!”
Daquele momento em diante o tempo que parecia se comportar como um cavalo selvagem transformou-se em uma lesma solitária.
Mesmo devagar, ele passou e a Avó chegou à festa.
A Menina foi correndo sorridente se jogou em seus braços e falou:
“Por que a senhora nos dá enigmas todos os anos?”
A Avó sorrindo não se conteve e contou o seu segredo:
“É para você aprender que, para crescer e conquistar, é preciso trabalho, perseverança. Agora conta, conta para mim a resposta do enigma!”
A Menina sorridente falou:
“Só ele me mostra como voa o tempo que eu quero que passe devagarinho e nele também eu vejo, como anda devagar o tempo que eu quero fazer voar.”
E assim a Menina conquistou o mais bonito de todos os relógios e o tempo voltou à sua cadência normal.