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REAJUSTE DA TABELA DO IRPF: MAIS UM REMENDO TRIBUTÁRIO

O brasileiro que paga em tributos pelo menos quatro meses, ou 120 dias, de trabalho deve se preparar para aumentar um pouco mais sua cota de contribuição à arrecadação pública. Os deputados aprovaram em Brasília, no começo deste mês, a Medida Provisória 528, confirmando o reajuste da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física em 4,5%, em vigor desde 1º de abril, mesma taxa a ser aplicada anualmente até 2014. É um reajuste bastante insatisfatório diante da perspectiva de uma inflação de 6,15% em 2011, projeção essa divulgada pelo boletim Focus, do Banco Central, um dia antes da votação no Congresso. Está abaixo ainda da taxa registrada em 2010, de 5,91% de elevação no IPCA.

O reajuste em 4,5% promove novo aumento disfarçado da carga tributária bancada pelos cidadãos. Ele não cobre a inflação imediata, tampouco uma defasagem que vem sendo acumulada desde 1995. Para piorar, contribui mesmo para a elevação progressiva desta diferença. A permanecer o teor da MP, a grande discrepância observada desde 1995 entre o reajuste da tabela e os índices inflacionários se perpetuará. Estudos realizados pelo Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) apontam que esse gap atingiu a 64,1% no final de 2010.

Cabe agora aos senadores dizerem se pretendem ou não manter tamanha injustiça contra o contribuinte brasileiro. Se não aprovarem a MP até dia 8 de agosto, esta perderá seu efeito e a situação se agravará, pois voltaremos à situação anterior a abril – ou seja, sem reajuste algum. Mas se mantiverem os 4,5%, a defasagem acumulada nos últimos anos será ampliada. O que os senadores poderiam fazer é, ao menos, equiparar a correção à inflação de 2010, deixando importante contribuição para que se interrompa o ciclo de corrosão do poder de compra de nossos cidadãos. E estimulando, de outro modo, uma situação mais favorável ao ciclo virtuoso da economia, colocando-a nos trilhos do crescimento sustentável, o qual demanda as reformas estruturais tão clamadas pelo empresariado e a sociedade brasileira.

Do ponto de vista do Sescon, a reforma tributária é a principal delas. Certamente dependemos também de melhor infraestrutura em logística, como portos, aeroportos e estradas, e de uma educação de qualidade que forme cidadãos plenamente habilitados e capacitados a enfrentarem os desafios do mercado de trabalho. Entretanto, enquanto vivermos sob o regime de um sistema tributário remendado, com sobreposição de impostos e/ou sua desatualização em relação aos indicadores econômicos, estaremos diminuindo a capacidade de investimento do setor privado. O recente reajuste aprovado pelos deputados em Brasília sobre a tabela do IRPF é mais um remendo, entre milhões de alterações processadas nas últimas décadas. Em 23 anos, por exemplo, o Brasil assistiu à edição de mais de 3,7 milhões de normas tributárias, as quais tiveram somente o intuito de operar como fermento no bolo da arrecadação pública, em vez de reparar perdas ou injustiças praticadas tanto contra o contribuinte físico quanto o jurídico.

O resultado é o inaceitável crescimento progressivo da carga tributária sobre a renda, incompatível com o sonho do desenvolvimento. Projeções extraoficiais dão conta de que ela superou 35% em 2010, mantendo o Brasil com padrão de impostos de Primeiro Mundo, mas de perfil de investimentos públicos próximo das nações subdesenvolvidas. Estamos entre os dez países que mais pagam tributos no mundo, no entanto, em termos de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), registramos apenas a 73ª posição entre 169 nações avaliadas pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Também nos indicadores relativos ao desempenho em educação, nosso país amargou posição de Terceiro Mundo. Resultados do PISA 2010 – Programa Internacional de Avaliação de Alunos aplicado a cada três anos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – nos colocaram em 53.º lugar entre os 65 países avaliados.

Esse novo episódio da saga tributária brasileira volta a sinalizar que, independente dos nomes ou cores partidárias que venham ocupando o governo, o setor público parece irremediavelmente tomado pelo vício de aumentar impostos como forma de atender a algumas metas macroeconômicas mais imediatas e cobrir buracos orçamentários. Nossos contribuintes não podem continuar à mercê desta falta de planejamento de governo e de Estado para curto, médio e longo prazo, o qual demandaria a racionalização da máquina pública em concomitância com novo sistema tributário, além do equacionamento do déficit previdenciário e do estímulo efetivo ao crescimento sustentável.

José Maria Chapina Alcazar, empresário, é presidente do SESCON-SP (Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas no Estado de São Paulo) e da AESCON-SP (Associação das empresas da atividade).

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